segunda-feira, 23 de julho de 2012

Estágio horizonte – IVº


Faltava o último ingrediente para que o Dr Octágonus desse vida à sua mais nova criação. Era o ser perfeito, inerrável, inalcançável, inenarrável, ininteligível. Na verdade, o Dr Octágonus não precisou de trabalho intelectual nenhum para construir seu empreendimento. Sonhou com ele na exata noite em que decidiu vender todo seu laboratório para comprar uma casa na praia e viver de um kisque de água de coco. Estava redigindo freneticamente os anúncios item por item no Mercado Livre, início do nascer de sol, quando pegou no sono. Acordou dizendo eureca. As engrenagens e ingredientes estavam ao alcance, exceto uma certa loção que precisava buscar pessoalmente com uns índios do pantanal. Achou uma promoção imperdível de passagens aéreas para Campo Grande no Melhores Destinos. Atrasou um pouco seu cronograma, pois a incursão na tribo exigiu dois meses de rituais de boas vindas e despedida. Chegou ao laboratório, aplicou a loção, esperou mais duas semanas para a absorção do fluido frente a matéria. E finalmente, ah, o sonho de sua vida, aplicou o último toque.

-        Olá... acorde!

-        Mestre, mate-me.

-        O que?

-        Mate-me.

-        Por quê?

-        Não importa, mate-me.

-        Nunca, você é minha criação mais perfeita.

-        Pois é essa perfeição que me dá lucidez suficiente para lhe exigir: mate-me.

-        Isso é loucura.

-        Exijo: mate-me.

O Dr. Octágonus  aplicou em si próprio a injeção letal: preferia morrer a matar o outro. Seu filho o cremou, pois enterrar causaria uma degradação ambiental muito grande. Sozinho, sem o dom de aniquilar-se, passou a existência vagando em busca de seu fim.

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